quinta-feira, 20 de agosto de 2015

STF adia decisão sobre uso pessoal de drogas

Janot (à esquerda) disse que, se o porte de pequena quantidade de droga for lega- lizado, traficantes transportariam volumes menores ( FOTO: LULA MARQUES/ AGÊNCIA PT )
Brasília. O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar, ontem, um recurso que poderá resultar na descriminalização das drogas para consumo próprio. O tema tomou quase toda a pauta do plenário, mas os ministros não começaram a votar.
A sessão foi dedicada às sustentações orais das partes do caso e dos "amigos da Corte", pessoas e instituições interessadas no tema. O adiamento se deu devido à falta de tempo suficiente para que todas as partes se manifestassem e para que os ministros proferissem seus votos.
Um dos primeiros a falar foi o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que se manifestou contrário à descriminaliza-ção das drogas para consumo próprio. Ele apresentou a visão do Ministério Público, que recomenda ao Supremo a rejeição de recurso sobre o tema.
O procurador-geral argumentou que a descriminalização pode modificar a forma como o tráfico é feito hoje. Ele considera que, se o porte de pequenas quantidades, que seria classificado como para consumo próprio, for legalizado, os traficantes passariam a transportar entorpecentes em pequenas quantias para se adequar à nova lei.
"Vamos lembrar que o mercado ilícito é algo que gira em torno de R$ 3,7 bilhões. Essas pessoas mais organizadas certamente não terão muito trabalho para organizar o exército das formigas", declarou.
Janot enfatizou ainda que a discussão em curso é sobre o uso de drogas, e não sobre o porte. Contudo, ele falou sobre o impacto do uso de entorpecentes na saúde pública e argumentou que 90% das pessoas expostas ao uso de drogas se tornam viciadas. "O argumento da maconha vem sempre como substrato, mas o que se está falando daqui é de pequeno porte de droga. Vamos lembrar do crack", comentou.
Sobre o julgamento em curso, Janot disse que, se a Corte decidir pela descriminalização, "estará interditando o legislativo de formular política pública".
Além do procurador-geral, o defensor público do Estado de São Paulo, que representa o autor do recurso, Rafael Muneratti, se pronunciou sobre o tema. Durante a sua fala, o defensor levou à tribuna números de outros países sobre drogas.
Ele citou o exemplo da Argentina, dizendo que a descrimi- nalização das drogas no país latino-americano reduziu a taxa de consumo de maconha de 9,7% em 2008 para 9,1% em 2010. "Assim como o consumo de cocaína, que reduziu 0,9% em 2010. A busca de alternativas fora do sistema repressivo é uma tendência mundial".
Já o procurador-geral de Justiça do Estado de São Paulo, Marcio Elias Rosa, se manifestou contra a descriminalização. Ele rejeitou que experiências internacionais possam ser usadas para fundamentar a descriminalização no País. "Espanha, Uruguai, Estados Unidos e países europeus podem ter adotado a descrimina- lização, porém o fizeram em meio à uma política estatal. Nenhum partiu da descriminali- zação. Ela pode ser a chegada, não pode ser a partida. Ao ser ponto de partida, ela soa como liberalizante", defendeu, lembrando que o Brasil vive um cenário de dificuldades com o crack.
A sessão também foi marcada por outras 11 sustentações orais, sendo seis delas em defesa da descriminalização e as outras cinco, contrárias. O julgamento será retomado hoje, com o voto do relator, Gilmar Mendes. Os ministros analisam a constitucionalidade do artigo 28 da lei 11.343, de 2006.
O texto define como crime adquirir, guardar ou portar drogas para consumo pessoal. O que está sob análise é um recurso que chegou ao STF em 2011 e tem repercussão geral, ou seja, servirá como base para decisões em todos os tribunais do País.

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