segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Perfil da Câmara trava relação com o Planalto

O cientista político Ernani Carvalho afirma que o elevado número de partidos para conciliar na base dificulta a governabilidade na Câmara Federal ( FOTO: D.A. PRESS )
O Governo Federal vivencia momento de instabilidade política que se concretiza na relação entre Executivo e Legislativo. No entanto, a presidente da República tem acumulado menos dores de cabeça com o Senado do que com a Câmara Federal. Na avaliação de cientistas políticos, o desenho das duas casas legislativas sempre apresentou diferenças de posicionamento. Experiência dos parlamentares, competências dos cargos e tamanho das bancadas são apontados como fatores que separam o perfil político de cada casa.
Conforme o cientista político Ernani Carvalho, professor da Universidade Federal de Pernambuco, há diferenças históricas do perfil da Câmara Federal e do Senado, embora ele ressalte que a tendência não pode ser utilizada como regra. "O Senado, geralmente, é composto por políticos experientes, que são ex-governadores com larga tradição política nos seus estados", aponta o docente.
A opinião de Ernani é corroborada por Valmir Lopes, professor de Ciência Política da Universidade Federal do Ceará. "Muitos políticos (que estão no Senado) já foram governadores ou são senadores que têm alguns mandatos, o que dá certa compreensão da administração e maior sensatez", alega. "A Câmara tende a representar a maior diversidade da sociedade, então não é de estranhar que ela vote de forma meio estranha ou até sem responsabilidade", completa.
Atribuições
Apesar das diferenças clássicas entre as duas casas, Valmir Lopes pondera que esse cenário vem sendo neutralizado cada vez mais nas últimas eleições. "Temos cada vez mais o Senado tendo atribuições semelhantes às funções da Câmara", salienta. "Progressivamente vamos fazendo com que isso ocorra. E é um fenômeno ruim", opina.
Contribuía para ampliar as diferenças entre Câmara e Senado, diz Lopes, a idade mínima para disputar os cargos, mas o critério tem sido flexibilizado. "A idade era critério importante pela ideia de que um político mais velho era mais sensato".
O cientista político ainda destaca que o Senado tem tendência a um perfil mais conservador. Argumenta que países com bicameralismo possuem outras instituições cuja função é equiparada ao papel e prestígio dos senadores, cargo que no Brasil tem o maior tempo de mandato dentre os eletivos: oito anos.
"O Senado tende a ser mais conservador onde tem bicameralismo. É uma casa revisora. Esse é o perfil, é a estrutura típica do bicameralismo. Em outros países há senadores vitalícios, não votam, mas são conselheiros", exemplifica Lopes.
Formam a atual composição do Congresso Nacional 81 cadeiras no Senado e 513 vagas para deputado federal. Essa heterogeneidade na Câmara Federal, segundo o professor Ernani Carvalho, amplia a rebeldia da Casa. "A Câmara já tem uma diversificação maior, isso torna as negociações algo mais complexo de se fazer", expõe.
Valmir Lopes pondera que nem sempre a Câmara foi mais trabalhosa na relação com o Executivo do que o Senado. Ele explica que, no segundo mandato do ex-presidente Lula, o petista enfrentou problemas com senadores. O docente lembra que, na campanha eleitoral de 2010, o PT, lançando Dilma Rousseff para suceder Lula, investiu de maneira substancial para eleger senadores alinhados ao governo.
O Ceará sofreu reflexos dessa atenção petista à eleição de senadores. Foi nesse contexto que Tasso Jereissati foi derrotado ao Senado pela dobradinha de José Pimentel (PT) e Eunício Oliveira (PMDB), apoiados por Lula. "No segundo governo do Lula, ele teve mais resistência no Senado, era o ponto de resistência. Agora ocorreu o inverso, em função da estratégia do próprio governo", relata Valmir Lopes.
Federalismo
Ernani Carvalho justifica que a atuação de deputados federais e senadores por si só já apresenta diferenças significativas, impactando no relacionamento com o Governo. "Ações dos senadores são mais focadas na política do federalismo, representam o interesse dos seus estados na República. Os deputados, muitas vezes, são pautados por políticas maiores e dentro do Governo nem sempre estão conduzidos pelos seus estados", argumenta.
Outro aspecto que dificulta a governabilidade na Câmara, destaca o professor, refere-se à elevada quantidade de siglas aliados, diferentemente do que ocorria no governo Fernando Henrique Cardoso. Ernani Carvalho lembra que o tucano gerenciava basicamente quatro partidos na base: PSDB, PMDB, PTB e o antigo PFL, que se tornaria DEM.

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