Em um cenário de instabilidade política, movimentado por escândalos de corrupção, existem dois focos de atenção: a possibilidade de impeachment da presidente Dilma Rousseff e de cassação do mandato do presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Nas duas alternativas, a oposição tem tido papel central na condução dos debates do Congresso Nacional, inclusive unindo partidos de históricos antagônicos lado a lado.
Neste mês, PSOL, PSB, PSDB, DEM, Rede Sustentabilidade e PPS se uniram para pressionar o presidente da Câmara a deixar o cargo. No entanto, as razões para o protesto das legendas não têm exatamente a mesma motivação. Frustrada no intento de ver o avanço da tramitação do impeachment no Congresso Nacional e em situação cada vez mais delicada diante do agravamento das denúncias contra Cunha, a cúpula do PSDB resolveu pressionar o peemedebista a deixar o comando da Câmara.
Para o cientista político Carlos Melo, professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), há algumas diferenças de atuação de partidos como PSOL e PSDB no caso Cunha, apesar de agora as duas legendas estarem lado a lado em defesa da renúncia do presidente da Câmara.
"O PSDB agora está fazendo o discurso da moralidade contra o Eduardo Cunha. No caso do PSOL, isso ocorre desde o começo do desgaste dele. O PSDB tentou pegar carona para viabilizar o impeachment e não percebeu que a situação ética do Cunha comprometia o próprio pedido. Agora foi obrigado a recuar com discurso moral", destaca.
Troca de favores
O professor de Ciência Política ressalta que alianças circunstanciais como essa não comprometem a imagem dos partidos desde que não ultrapassem a linha da troca de favores. "No caso do PSOL, é importante aceitar (apoio), porque se mantem dentro da perspectiva inicial de sempre. O PSDB que aderiu depois de ter quebrado a cara. Em política não se rejeitam apoios quando apoios não cobram nada".
Para o docente, o limite para a formação dessas alianças é o respeito ao "ponto programático" da legenda. Sobre a continuidade de outras agremiações de oposição ao lado de Cunha, mesmo diante de provas robustas contra o presidente da Câmara, Carlos Melo relata que dirigentes desses grêmios atuam junto à base partidária sensibilizando sobre a importância de manter acesa a pauta do impeachment.
"A base dele (do Solidariedade, partido aliado de Cunha) aceita isso como argumento, aceita a composição com uma figura como essa que não é muito ética. Mas o PSDB não aceita", declara o professor.
Na avaliação do cientista político André Pereira, professor da Universidade Federal do Espírito Santo, acordo entre Eduardo Cunha e o Governo Federal inflamou os ânimos tucanos contra o peemedebista. "O PSDB é que tem sido mutante na história, porque o interesse do PSDB é atacar o Governo. Nesse momento passou a ser conveniente atacar Cunha desde que ele passou a fazer acordo com o Governo", opina o acadêmico.
Instável
O especialista reforça que a imponderabilidade sobre o desenrolar da crise política torna o cenário mais obscuro, uma vez que fatos inusitados têm a capacidade de alterar as estratégias da base e da oposição. "Está tudo muito instável, a bancada do PT que tinha fechado com Cunha está dividida, ele está negociando com qualquer um que seja para empurrar a cassação para o ano que vem. O cenário é volátil. Quem está mudando de posição é o PSDB e o Cunha. Quando o Cunha sinalizou acordo com o Governo, o PSDB atacou", diz.
Ele cita como episódio inusitado a prisão do líder do Governo no Senado, o petista Delcídio do Amaral, detido por tentar atrapalhar investigações da Lava Jato. "Nós estamos sendo levados pela onda de notícias que aparecem a cada momento. Ninguém esperava o escândalo Delcídio. Essas novidades vão aparecendo. O que impede que amanhã apareça grande novidade sobre o Cunha, mais sólida sobre ele? O Delcídio foi preso. De repente, amanhã, prendem o Cunha".
Para o professor de Ciência Política José Roberto Siebra, da Universidade Regional do Cariri, a parceria entre partidos políticos que não têm identidade semelhante em prol de uma bandeira em comum está dentro do processo natural de construção de projeto político e de governo próprio de todas as siglas.
"Todos os partidos, principalmente os mais à esquerda, têm a as estratégicas, que são ações a longo prazo, e as táticas, que são circunstanciais para chegar ao poder", explica. "Não há união do ponto de vista da formalidade. Ele (Eduardo Cunha) caiu em desgraça. A união é um objetivo em comum sem nenhum critério, a única coisa que os une é derrotar o Cunha", completa.
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