sábado, 26 de dezembro de 2015

Hospital psiquiátrico Santa Teresa fecha dia 10, após 45 anos de funcionamento em Crato

O Hospital há mais de 10 anos, luta para não fechar diante das dificuldades e insuficiência de recursos Fotos Elizangela Santos
A Casa de Saúde Santa Teresa luta há mais de 10 anos para não fechar, diante das dificuldades e insuficiência de recursos Fotos Elizangela Santos

O local se encontra com 63 pacientes, que recebem alta até o começo do próximo ano. 16 se encontram na emergência. São 36 homens e 27 mulheres.
Funcionários da Casa de Saúde Santa Teresa, em Crato, realizaram hoje a última confraternização no local. Todos estão de aviso prévio e se despedem do único hospital psiquiátrico do Cariri, referência no tratamento de pacientes da região e para estados vizinhos. Com uma previsão de fechamento para março do próximo ano, a data acabou sendo antecipada para o dia 10 de janeiro de 2016. Alguns funcionários já não trabalham mais no local a partir do dia 2. As crises sucessivas e verbas insuficientes do Sistema Único de Saúde (SUS) para manter o local são o principal motivo. A casa de saúde há alguns anos supria muito de suas necessidades por meio de doações. São cerca de 45 anos em funcionamento.
Famílias se desesperam por não terem para onde levar agora os pacientes. Mesmo com vários apelos aos governos estadual e federal, parlamentares da região, município e até mesmo a própria sociedade, não houve condições de manter a casa. Desde o início do ano passado, que o local estava já em preparação para o fechamento. A média paga por cada um dos pacientes, de R$ 42, a diária, que acontecia desde o primeiro semestre deste ano, não dava para cobrir todas as despesas.
São cerca de 70 funcionários e todos já se encontram de aviso prévio. “Estamos muito tristes com esse momento, mas é mais desolador ainda para as famílias dos pacientes, que precisam do tratamento e muitas vezes não têm como controlar uma pessoa doente em casa”, afirma o auxiliar de limpeza, José Ailton da Silva, há 16 anos trabalhando no local. Ele disse que a partir do próximo dia 2 de janeiro, não estará mais no hospital.
A Casa de Saúde recebe pacientes de estados como o Pernambuco, Piauí e Paraíba. Até maio deste ano, se encontrava com cerca de 200 pessoas internadas, fora os atendimentos e acompanhamentos que aconteciam, durante a semana. Agora são apenas 63. O espaço ficava lotado, diante da carência de tratamentos psiquiátricos na região. Desde outubro que se intensificou a saída dos pacientes.
Para a direção do hospital o valor que era repassado para os pacientes do SUS, há vários anos não estava sendo suficiente para manter os custos da instituição, por não ter sido corrigido. Ao longo de mais de 10 anos, o local vinha lutando para se adaptar à Lei Antimanicomial. Enquanto isso, famílias ficam atônitas, sem ter ideia do que fazer com pessoas que sofrem de distúrbios mentais em suas famílias, principalmente os mais agressivos.

Um dos únicos a atender no interior do Nordeste
Uma das diretoras da casa de saúde, Ana Isabel Barreto Machado Dias, afirma que desde a reforma psiquiátrica o hospital vem buscando se adequar, inserindo a humanização do tratamento. São cerca de 45 anos de serviços, mas não há auxílio governamental além dos credenciamentos, por meio SUS. O hospital é atualmente um dos únicos a atender no interior do Nordeste, já que desde a reforma poucos permaneceram abertos. Ela também atribui o fechamento dos equipamentos à visão governamental em que se acredita que o problema da psiquiatria seja resolvido com a redução na quantidade de leitos, e os encaminhamentos para os Centros de Atenção Psicossocial (Caps) e clínicas. “Infelizmente, com mais de 15 anos que foram criados os Caps, a demanda continua a mesma ou até mesmo maior”, avalia.
A internação no Santa Teresa é integral, e quando o paciente está em crise nos Caps é encaminhado para o local. Com isso, a diretora tem questionado para onde serão levados esses pacientes. Não há, na verdade, segundo ela, outro lugar que realize o tratamento. Os pacientes do Santa Tereza são aqueles que dependem unicamente do governo. Há casos que chegam ao hospital em carros da polícia, porque a própria sociedade não sabe lidar com a problemática do doente mental.
São mais de oito anos sem aumento nas diárias. A direção do hospital, com os atrasos dos repasses federais, afirma que fica dependendo dos empréstimos bancários, para não atrasar o pagamento dos funcionários. O quadro foi reduzido, com a necessidade de enxugamento ao máximo a folha. “Chega uma hora que o próprio teto financeiro do que é repassado pelo Ministério da Saúde atrasa e ficamos de mãos atadas, sem conseguir manter o hospital”, diz ela.
As despesas diárias de um paciente equivalem a cinco refeições, assistência médica psiquiátrica, clínica de psicologia, assistente social, terapeuta ocupacional, corpo de enfermagem e medicação. Mesmo recorrendo ao Estado já uma vez, ela afirma que não obteve esperança em relação a um auxílio para os serviços. Ano passado, chegou a conseguir isenção de impostos municipais, no valor de quase R$ 8 mil, que ajudou nas despesas. Para chegar a um alinhamento com as despesas, calcula que a diária por paciente deveria chegar a pelo menos R$ 150,00.
Mesmo com uma grande demanda de pacientes, os médicos têm dado prioridade aos casos mais complexos. O local também funciona como hospital dia. No local há pacientes encaminhados pela justiça, mesmo não sendo manicômio judiciário. Com todas as dificuldades, a única alternativa, conforme Ana Isabel, foi encerrar as atividades, da forma menos traumática, minimizando a quantidade de pacientes aos poucos. Familiares, já chegaram a fazer até abaixo-assinado pedindo o não fechamento do hospital.
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Famílias preocupadas não sabem para onde encaminhar casos mais graves
A situação das famílias que necessitam do serviço é desoladora. Para a dona de casa, Francisca Elias do Nascimento, é extremamente preocupante a possibilidade de fechamento do hospital. Ela tem um filho internado no local há vários meses. Já somam-se quatro internações. Nas crises, o filho se torna agressivo e não há outra alternativa, a não ser encaminhar para o hospital psiquiátrico.
A dona de casa mora em Juazeiro do Norte e diz que não sabe sequer como vai fazer. “Aqui é o único local que acolhe ele e há necessidade de um tratamento”, diz ela. O filho já chegou a agredir as pessoas de casa e também na rua. Segundo a mãe, já quiseram até matá-lo por conta disso. Dona Francisca recorreu à Defensoria Pública para que o seu filho possa ter oportunidade de tratamento em uma clínica, durante uma necessidade de internamento. Aguarda uma decisão sobre o caso.
O professor Renato Hélio teve que se deslocar do Estado do Pernambuco para encaminhar o irmão com a mãe até o hospital psiquiátrico. “Vivo em outro lugar trabalhando e fico apreensivo com essa situação dela ter que conviver com uma pessoa que a gente sabe que é agressiva e só tem esse lugar para a gente recorrer”, afirma. A luta agora é ver se consegue transferi-lo para uma clínica.
A dona de casa, Cícera Maria, tem necessitado dos serviços da casa de saúde, como única alternativa para poder levar o seu tio do Município de Aurora, depois de 12 anos que ele residiu em Fortaleza. Após um surto, ela o levou para o Santa Teresa, onde o tio se encontra internado há mais de 40 dias. “Na minha casa são três idosas, incluindo a minha avó de 94 anos. Não há a menor possibilidade delas cuidarem dele. Nas crises ele é agressivo e quer matar o povo”, diz. Para ela, se não houver a possibilidade de internar no Crato, a única alternativa é encaminhar para Fortaleza. “Gostaria que dessem um jeito de não fechar, porque as pessoas de Aurora são todas encaminhadas para cá. É uma pena”, lamenta.

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