No último sábado (13), uma paciente passou, pela primeira vez no Ceará, por um procedimento cirúrgico para inserção de pele humana. Ela teve 32% da área corporal queimada após um incêndio em seu apartamento, ocorrido na madrugada do dia 9 de fevereiro. A cirurgia foi realizada no Hospital São Mateus, para onde a paciente foi encaminhada após ser atendida no Instituto Dr. José Frota (IJF).
À frente do procedimento, o cirurgião plástico Edmar Maciel expõe que o procedimento é realizado poucas vezes no Brasil, uma vez que o investimento é bastante reduzido no tratamento de pessoas que passaram por queimaduras.
"O Ministério da Saúde diz que o Brasil precisa de 13 bancos de pele. Hoje nós temos três, sendo que o de Recife está fechado e o de São Paulo tem uma captação reduzida. Só sobra um, no Rio Grande do Sul, que foi o que nos mandou a pele. Eles tinham disponibilidade de 2.500 centímetros quadrados de pele e nos enviaram na sexta-feira (12), via Ministério da Saúde", conta o médico especialista, que também é presidente do Instituto de Apoio ao Queimado.
O problema está no fato de que o tratamento dado às vítimas de queimadura no Brasil está atrasado em mais de 40 anos. De acordo com Edmar Maciel, só no ano passado, o IJF registrou quase 3.800 pacientes do tipo. Aqueles que procuram a rede pública após uma queimadura são tratados com a pomada sulfadiazina de prata, o que já não é mais utilizado em países europeus, Estados Unidos e em vizinhos como Argentina, Uruguai e Chile.
"A pele humana, que chamamos de homóloga, recobre a ferida, evitando contaminação externa e a perda de líquidos e proteínas, além de diminuir a dor do paciente e permitir um maior intervalo entre as trocas de curativo. Essa é a primeira linha de tratamento no exterior. Nesses outros países, quando não se tem a pele humana, usa-se a pele de animal, como porco ou cão. Mas até hoje nunca houve pesquisas registradas no Brasil para uso de pele de animal", expõe o cirurgião.
Atualmente, pesquisa em andamento no Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento em Medicamentos (NPMD) da Universidade Federal do Ceará (UFC) busca desenvolver a pele da tilápia, peixe brasileiro de água doce, como curativo biológico e temporário para as queimaduras. Esta é a primeira experiência no mundo em que é utilizada a pele de um animal aquático.
A iniciativa foi tema de reportagem do Diário do Nordeste, publicada no caderno Vida no dia 24 de janeiro. A equipe responsável pelo estudo é composta, além de Edmar Maciel, pelo diretor do NPDM, Odorico Moraes, e pelos pesquisadores Elizabete Moraes, que coordenará a pesquisa em humanos, Marcelo Borges, de Pernambuco e Nelson Piccolo, de Goiás.
Aprovação
O teste em pacientes reais deve ocorrer após a aprovação do Comitê Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), o que deve permitir o início da fase clínica entre junho e agosto desse ano. O Instituto Dr. José Frota será o primeiro local onde a técnica será aplicada, seguido de hospitais em outros seis estados brasileiros.
Antes disso, contudo, a pesquisa com a tilápia passou por outras onze fases, incluindo a análise da pele, a preparação do material, bem como testes em animais. "Torna-se uma alternativa efetiva e barata, porque hoje descarta-se 99% da pele da tilápia, que é abundante no Nordeste. Além disso, verificamos que tem semelhanças com a pele humana quanto à umidade e ao grau de colágeno, o que é importante para a cicatrização. Levaremos de 12 a 18 meses para implementar e ter resultados sobre a aplicação nos seres humanos", conclui Edmar Maciel.
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