Juazeiro do Norte. Investir na arte popular com instrumento didático para a sociedade tem sido uma das preocupações do xilógrafo Demontiê Lourenço Gonzaga. Ele irá lançar, durante esta semana, a exposição Água Fonte da Vida, no Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBNB) Cariri. O trabalho ficará exposto por um mês, de 8 de abril a 8 de maio, como forma de levar ao público, principalmente para crianças, adolescentes e estudantes, uma reflexão sobre o futuro do Planeta e a preservação das águas, na semana em que a maioria dos municípios reflete a temática do meio ambiente.
A coleção, com 15 xilogravuras, foi produzida em pouco mais de três meses. Uma preocupação que aflige o artista, que vem de uma família de xilogravadores, Demontiê percorreu os corredores da gráfica Lira Nordestina, e foi um dos que se aproximou dessa arte, mesmo tendo que se embrenhar pelo ofício da fotografia para sobrevier. Com os irmãos Cícero e Zé Lourenço, deixa a sua marca numa das mais emblemáticas manifestações do Nordeste, com forte configuração em termos de produção em Juazeiro do Norte.
Para ele, infelizmente, a xilogravura ainda não é arte valorizada como deveria. Mesmo tento uma grande tendência para o traçado na madeira, com o incentivo permanente do amigo, o jornalista e pesquisador, Gilmar de Carvalho, Demontiê diz que procura, mesmo assim, não deixar a atividade de lado.
Natureza
As suas coleções marcam uma geração que tem se preocupado com a natureza. No ano passado, ele realizou uma exposição sobre os animais em risco de extinção. O trabalho rendeu 20 matrizes com as diversas espécies de animais, em vias de desaparecer da humanidade. Um deles, o soldadinho-do-araripe, em risco crítico, e que existe somente na região do Cariri.
"O meu objetivo é chamar a atenção para uma realidade bastante preocupante, e que atualmente as pessoas não vêm dando a atenção como verdadeiramente deveriam. Tanto as autoridades, como a própria população. E muitas pessoas no mundo já sofrem com a escassez desse líquido, que garante a vida no Planeta", afirma o xilógrafo.
Temáticas
Dentro da temática, ele traz diversas formas de reflexão, desde o desmatamento, o tratamento dado nas cidades aos rios como depositários de lixo e esgotos, o uso do agrotóxico na natureza, até os efeitos climáticos advindos dessa degradação. Para ele, é necessária uma conscientização urgente, pois a própria vida no planeta se coloca em risco, diante dessa realidade. "Ainda há tempo para mudar tudo isso, mas as autoridades, que não estão muito preocupadas, é que devem manter esse estado de alerta para começar a mudar algo", ressalta.
Caos
A ideia de fazer o álbum foi uma forma de mostrar para as pessoas, de forma artística, um trabalho que fizesse com que pensassem no que fazer para amenizar esse caos que já vem existindo, com a falta de água. No caso de sua própria cidade, ele destaca a crise presente em Juazeiro do Norte e questiona o que vem sendo feito para as gerações futuras. "Sabemos que não é uma fonte inesgotável. Temos que fazer alguma coisa", afirma.
O trabalho tem uma sequência. O xilógrafo enfoca desde o momento do banho das pessoas, com o desperdício de água no chuveiro, na lavagem da calçada de casa, às queimadas sem controle, e até mesmo as agruras da seca no Nordeste e o sofrimento dos mais pobres. Os grandes problemas enfrentados nas cidades, em função dos desastres causados pelo desequilíbrio ambiental, segundo ele, estão inseridos nessa forma de condução que a humanidade vem causando à natureza.
Relevância
O seu aprendizado com a xilogravura traz uma inspiração fundamental para que ele possa exercitar o trabalho, diante de temas que considera relevantes. Depois de 15 anos no Estado de Alagoas, Demontiê retorna a Juazeiro do Norte, com a mesma paixão de sempre, de continuar exercitando o seu trabalho em busca espaço para levar a mensagem ao público. Sempre está produzindo, nem que seja para ele mesmo.
Demontiê Lourenço diz que cada xilógrafo tem o seu modo de ver o desenho e explorar temas com uma visão peculiar. Mesmo produzindo pouco, durante o período em que não esteve no Ceará, o retorno ao celeiro de produção o incentivou a buscar novos traços.
A sua ideia é que as secretarias municipais possam apoiar o projeto e os alunos das escolas da região ter acesso a essa leitura reflexiva, além de conhecer a arte da xilogravura e a sua contribuição para uma visão crítica e didática da sociedade.
A sua inspiração para a área começou depois da sua chegada ao Cariri. Veio de Iguatu, no Centro-Sul do Ceará, para a região Sul do Estado e, com os irmãos Cícero e José Lourenço, se embrenhou na arte.
Desde 2002 decidiu entrar no universo da xilogravura e, a pedido de Gilmar de Carvalho, fez o seu primeiro trabalho, com álbum sobre engenho de farinha. Desde o cultivo e colheita da mandioca, o trabalho comunitário da preparação até a finalização artesanal do produto, nos aviamentos.
Para Demontiê, o campo da criatividade, por meio da arte de talhar na madeira, vem de longe. Ele teve como uma das grandes inspirações o trabalho desenvolvido pelo artista plástico xilógrafo Stênio Diniz, que já esteve expondo as suas xilogravuras em vários países da Europa, Sul e Sudeste brasileiros. "Ele é um dos grandes xilogravuristas em que me inspiro. Considero o seu trabalho muito bom", afirma o artista.
O xilógrafo não possui um trabalho muito extenso na área. Já produziu algumas capas de cordéis, e atualmente considera que a arte para ele está mais para um hobby. Teve a oportunidade de chegar na histórica Gráfica São Francisco, que se tornou Lira Nordestina.
O local, atualmente em funcionamento no Centro Multiuso, passará por uma reformulação, para o fortalecimento do cordel e da xilogravura, além do rico acervo da gráfica histórica, com maquinários do século XIX que estarão em exposição permanente. (E.S.)
Mais informações:
Xilogravuras - Demontiê Lourenço
Avenida Ailton Gomes, 2922A
Bairro Planalto
Juazeiro do Norte
Telefone: (88) 3571-4407
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