Presos assassinados, carbonizados, corpos mutilados e sequer quantificados, muito menos, identificados. Agentes penitenciários em greve, na iminência de um conflito armado com a Polícia Militar. Familiares tensos, sem informações e proibidos de visitar os parentes. Rodovia bloqueada, pedras, pneus, fumaça e fogo. As cenas, dignas de ficção, ocorreram no último fim de semana nas unidades penitenciárias de Fortaleza e Região Metropolitana. Com a greve dos agentes penitenciários no sábado (21), as visitas aos presos foram suspensas, resultando em rebeliões no Complexo Penitenciário de Itaitinga.
Houve acerto com o governo e os grevistas retornaram às funções, mas não conseguiram impedir que novos conflitos ocorressem, deixando um verdadeiro rastro de sangue por entre os pavilhões. Até o fechamento desta edição, cinco mortes haviam sido confirmadas pela Secretaria da Justiça e Cidadania (Sejus), ocorridas no sábado e no domingo (22). Há informações, de fontes ligadas à Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), que o número de vítimas seria ainda maior: corpos mutilados foram encontrados e, por isso, o número de vítimas seria ainda impreciso.
A greve dos agentes penitenciários foi considerada ilegal pela Justiça ainda na sexta-feira (20). Os profissionais, no entanto, mantiveram a paralisação, no sábado. Com isso, a entrada das visitas aos presos foi impedida, apesar de haver reforço da Polícia Militar, acionada justamente para garantir o direito dos presidiários à visitação.
A revolta então teve início, dentro e fora das unidades. Na Casa de Privação Provisória de Liberdade (CPPL) IV, por exemplo, familiares chegaram a depredar vidros do lado de fora e bloquearam a BR-116, no trecho que dá acesso ao presídio, gerando transtornos ao trânsito. Do lado de dentro, houve acirramento de ânimos. Na CPPL III, ocorreu luta corporal entre os presos, resultando nas mortes de dois detentos. As identificações deles, no entanto, só serão divulgadas após exame de DNA, segundo informou a Sejus.
Do lado de fora das unidades, a tensão entre agentes, policiais e familiares, por pouco, também não terminou em tragédia. A Polícia teria sido impedida de entrar nas unidades e houve o temor de um confronto armado.
Acordo
Ainda na tarde de sábado, após assembleia, os grevistas aceitaram a proposta do governo do Estado e decidiram retornar às atividades. Contudo, mesmo com os agentes voltando às atividades, os ânimos dos presos novamente ficaram acirrados.
Durante a manhã de domingo, houve rebelião na Unidade Prisional Desembargador Francisco Adalberto Barros de Oliveira Leal, em Caucaia. Com isso, a visitação, que estava prevista para acontecer, foi suspensa, conforme a Sejus. Os conflitos entre os próprios internos resultaram em três mortes. As vítimas foram identificadas como Roberto Bruno Agostinho da Silva, 23 anos, que respondia por homicídio; Rian Pereira Paz, 33 anos, que respondia por tráfico de drogas; e Daniel de Sousa Oliveira, 22 anos, que respondia por homicídio e latrocínio. A situação teve intervenção da Polícia e foi contida ainda pela manhã.
Já no início da tarde, internos da Unidade Prisional Agente Luciano Andrade Lima iniciaram uma nova rebelião. Às 17h40, policiais e agentes penitenciários dos grupos especializados conseguiram conter a situação.
No Instituto Penal Feminino Desembargadora Auri Moura Costa, Penitenciária Francisco Hélio Viana e Instituto Penal Professor Olavo Oliveira II (IPPOO II), a visitação dos internos ocorreu normalmente no domingo, de acordo com a Secretaria.
Apuração
O Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) informou que irá apurar a autoria e responsabilidades dos crimes de homicídio e danos ao patrimônio público que ocorreram nas unidades penitenciárias durante as rebeliões no fim de semana. O Procurador-Geral de Justiça, Plácido Barroso Rios determinou a instauração do procedimento.
O Ministério Público também irá investigar o possível cometimento de crime de desobediência por parte do Sindicato dos agentes, já que o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJ-CE), através de liminar, havia suspendido a greve, declarando-a ilegal. A reportagem tentou contato por telefone na noite de ontem com o presidente do Sindicato dos Agentes e Servidores do Sistema Penitenciário do Estado do Ceará (Sindasp-CE), Valdomiro Barbosa, mas as ligações não foram atendidas.
Nos dois dias, a promotora corregedora dos presídios em Fortaleza, Joseana França e a coordenadora do Centro de Apoio Operacional Criminal (CAOCRIM), promotora Flávia Unneberg, acompanharam as rebeliões nos presídios.
Visitas
Ainda na noite de ontem, vários familiares permaneciam do lado de fora do complexo penitenciário, aguardando informações sobre os parentes. Segundo o juiz corregedor dos presídios de Fortaleza, César Belmino, as visitas que não ocorreram durante o fim de semana por conta da suspensão e dos conflitos, serão remarcadas para outra data, não havendo prejuízo ao direito de visitação dos detentos.
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