Os conselheiros do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Ceará (TCM) se reuniram normalmente ontem e redistribuíram todos os processos de prestação de contas que, no início da semana, haviam sido redistribuídos para os conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE), em razão da emenda constitucional que havia extinguido o TCM e transferido suas competências para o TCE.
Também ontem, o presidente do Tribunal de Contas do Estado, conselheiro Edilberto Pontes, publicou nota no site do TCE, informando a suspensão de todos os atos praticados por aquela Corte, por conta da emenda de extinção do TCM, no decorrer desta semana.
A reunião dos conselheiros do TCM e a nota do presidente do TCE aconteceram por conta da decisão da ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), da última quarta-feira, suspendendo todos os efeitos da emenda constitucional aprovada pela Assembleia Legislativa cearense, acabando com o TCM, a partir de pedido da Associação dos Tribunais de Contas, em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI).
Inteiro teor
A Assembleia Legislativa do Ceará, como o Diário do Nordeste informou em sua edição de ontem, foi notificada, ainda na noite de quarta-feira, da decisão liminar da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, mas ainda não se manifestou, oficialmente, sobre as providências que deverá adotar.
A quase totalidade dos deputados, ainda ontem, não conhecia o inteiro teor do despacho da ministra, nem tampouco a petição inicial da ADI que motivou a suspensão dos efeitos da emenda constitucional, apresentada pelo deputado Heitor Férrer (PSB) e outros parlamentares, e aprovada no último dia 21.
O relator da ADI é o ministro Celso de Melo. Como o Supremo Tribunal Federal está em recesso, a decisão liminar foi proferida pela presidente da Côrte, até que o relator se manifeste, no início de fevereiro, quando os trabalhos daquela Corte voltarão à normalidade.
O principal questionamento dos autores da ADI, representando a Associação dos Tribunais de Contas do Brasil, é o processo legislativo. Eles também citam vício de iniciativa, pois entendem que até para extinguir o Tribunal de Contas, a iniciativa teria que ser da própria Corte, embora reconheçam, na petição, a competência do Estado de extinguir o Tribunal de Contas dos Municípios.
Extinguir ou fundir
"Ressalte-se que não se desconhece a antiga jurisprudência do STF que afirma a possibilidade jurídica de o Estado extinguir seu Tribunal de Contas dos Municípios ou de fundi-lo ao Tribunal de Contas do Estado. A medida é possível. Contudo, tal alteração na organização do controle das contas públicas deve obedecer às condições previstas na Constituição Federal", diz o texto.
Os advogados da Atricon, dentre outros pedidos, além da declaração de inconstitucionalidade da emenda que extinguiu o TCM, defendem que "caso não seja declarada a inconstitucionalidade formal de toda a Emenda, seja declarada a inconstitucionalidade da expressão 'independentemente da origem de nomeação', constante do artigo 2º § 1º, da Emenda à Constituição do Estado do Ceará nº 87, de tal modo que o critério da antiguidade prevaleça apenas no que toca aos conselheiros que possuem a mesma origem da vaga eventualmente aberta no TCE".
Este dispositivo poderia beneficiar o conselheiro Ernesto Saboia, o mais antigo do TCM, que seria o primeiro conselheiro em disponibilidade a ser aproveitado no TCE na vaga que será aberta, nos próximos dias, com a aposentadoria do conselheiro Teodorico Menezes, cujo processo já está em curso.
Outro dispositivo que a Atricon pede seja considerado inconstitucional é o que trata da possibilidade de um dos conselheiros em disponibilidade, no caso de abertura de vaga no TCE, ser rejeitado pela Assembleia por três quintos dos votos dos deputados estaduais. A alegação é de que os conselheiros do TCM já foram sabatinados pelos deputados e não se justificaria uma nova sabatina para que eles pudessem assumir uma vaga no TCE.
Urgência
Alguns deputados da Casa alegam que o processo de apresentação e votação da emenda constitucional, cuja constitucionalidade está sendo questionada, se deu de forma legal e constitucional, enquanto outros parlamentares reclamam desta e de outras aprovações que ocorreram nas últimas duas semanas, inclusive uma outra emenda constitucional, a do Ajuste Fiscal, votada no mesmo dia.
A Lei Orçamentária Anual (LOA), aprovada na noite da última quarta-feira, deve ser encaminhada até o início da próxima semana para o Palácio da Abolição, conforme informou a direção do Departamento Legislativo. Estava em pendência somente as assinaturas dos membros da Mesa Diretora. O líder do Governo, Evandro Leitão (PDT), disse que no Orçamento a única mudança que ocorreu foi em relação aos valores destinados ao Tribunal de Contas dos Municípios, que seriam destinados ao Tribunal de Contas do Estado.
Cerca de R$ 20 milhões, que originalmente eram recursos certos para o órgão, foram remanejados para a Saúde, visto que técnicos da Seplag avaliaram que os R$ 102 milhões direcionados ao TCM poderiam ser destinados com rubricas sobrepostas.
"Tiramos esse valor e colocamos os outros R$ 82 milhões para suprir as necessidades do TCM. A gente recebeu a decisão do STF de formaNATURAL, porque decisão judicial não se questiona, se cumpre. E as medidas cabíveis devem ser adotadas pela Assembleia", afirmou.
Leitão disse que o presidente do Poder Legislativo, Zezinho Albuquerque (PDT), afirmou que tomaria as medidas judiciais cabíveis, discutindo com a Mesa Diretora se iria utilizar o jurídico da Casa para tratar do assunto. Vice-líder do Governo e presidente da comissão de Orçamento e Finanças, o deputado Julinho (PDT) defendeu que o mérito ainda não foi julgado e que o posicionamento da ministra não foi quanto à constitucionalidade, apenas suspendeu os efeitos enquanto o ministro Celso de Melo julga os méritos.
Remanejar
"Nós vamos esperar o posicionamento do STF. Estamos tranquilos, tanto que no meio da votação do Orçamento, quando tomamos conhecimento do fato, mesmo não sendo oficialmente, decidimos manter os recursos do TCM até então extinto", disse. Ainda assim, dependendo do resultado da decisão do ministro relator da matéria, o governador do Estado, Camilo Santana, está autorizado a remanejar os recursos do Orçamento.
A Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil questionou o rito de urgência de votação da PEC, inclusive, pelo fato de a segunda discussão ter ocorrido no mesmo dia em que houve a extinção do órgão em primeiro turno. "Caso seja dito que não valeu porque o rito não se deu conforme a Constituição, a Assembleia pode se reunir e ver que atitude tomar. Vejo que estão suspensos apenas os efeitos da tramitação da PEC", disse Julinho.
No entanto, Roberto Mesquita (PSD) reclamou da retirada de R$ 20 milhões que seriam para o custeio do TCM no relatório final do relator, que foi o líder do Governo, Evandro Leitão. "Eles não conseguiram matar com a Lei, mas querem matar de fome", apontou. Para o deputado, até mesmo a LOA tem motivações para ser contestada, visto que emendas foram apresentadas no Plenário e não se convocou a comissão de Orçamento para deliberar sobre elas.
"Eu vou provocar a Assembleia e até o meu partido, no caso da PEC do teto dos gastos, porque passou pelo mesmo rito da PEC do TCM. Os deputados estavam cometendo o mesmo delito. Vou requerer à Assembleia, e caso seja negado vou apresentar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ao Supremo", disse Mesquita.
O deputado Renato Roseno (PSOL) se absteve da votação do Orçamento 2017. Ele chegou a solicitar a suspensão da votação na noite de quarta-feira, para que os deputados se debruçassem melhor sobre o momento, uma vez que a liminar do STF suspendia todo o processo de extinção do TCM. No entanto, seu pedido foi negado. "A liminar do STF determinou a volta do status quo antes da PEC, e essa situação me parece ser de muita insegurança".
Odilon Aguiar (PSD), por outro lado, criticou a economia de R$ 20 milhões destacada pelo líder do Governo quando da leitura do parecer do Orçamento. Segundo ele, esse dinheiro vai fazer falta. "Acredito que houve uma transgressão nesse processo. A Assembleia fala em economizar, mas tem que olhar para dentro de casa porque a própria Assembleia não faz isso".
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