Juazeiro do Norte. Mais de 12% dos quase 239 mil habitantes deste município não conseguirão ler esta reportagem. Isso porque 29 mil juazeirenses com 15 anos ou mais são analfabetos, segundo dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (Pnad).
"É um dado preocupante e que nos entristece", pontua a secretária de Educação de Juazeiro, Maria Loureto de Lima. Além de alto, o índice apresenta significativa crescente nos últimos anos. "Em 2010, a cidade tinha 23 mil analfabetos", acrescenta a titular, ao detalhar o aumento superior a 20%.
Contramão
Essa elevação na quantidade de pessoas que não sabem ler ou escrever em Juazeiro do Norte vai na contramão da taxa geral de analfabetismo observada entre brasileiros com a mesma faixa etária. Pelo quarto ano consecutivo, o Pnad identificou queda na porcentagem. Em 2012, 8,7% da população era considerada analfabeta. No ano seguinte, esse índice caiu para 8,5%; em 2014 para 8,3% e, em 2015, ano da última pesquisa, a taxa foi estimada em 8% da população, o que representa 12,9 milhões de brasileiros.
"É preciso ressaltar que a análise em Juazeiro é complexa. Milhares de romeiros que visitam a cidade durante as romarias acabam ficando e passam a integrar essa estatística", justificou.
Contudo, para reverter esse quadro na maior cidade do interior cearense, Maria Loureto aposta na reformulação da programação pedagógica, valorização dos professores, seleções para contratos temporários e efetivos e reestruturação física das escolas.
"Há uma necessidade premente de se modificar a Educação do Município. Vamos promover a formação para professores junto àqueles que estão chegando por meio da seleção feita em março, e iremos trabalhar a motivação e conteúdos específicos para que haja uma compreensão maior na modalidade de ensino e, a partir dessas formações, intercalando-as, nós iremos fazer um acompanhamento com os professores formadores e da Educação de Jovens e Adultos, detalhou. E disse, ainda: "Esse processo vai subsidiar o sistema de avaliação que será feito de forma continua e frequente, para que a gente vá vencendo as etapas das deficiências de aprendizagem desse público".
Na residência do agricultor José Oliveira Custódio, morador do bairro Mutirão, uma das áreas mais pobres da cidade, o mundo parece ter outra ótica. Ele e sua esposa, ambos de 51 anos, não sabem ler ou escrever. "Quando chega alguma correspondência, a gente pede pra vizinha ler ou então meu filho mais novo", diz Seu Candim, como é conhecido.
Trabalhadores rurais desde os nove anos, eles contam que tiveram que deixar a escola para ajudar no sustento de casa. Dois dos quatro filhos do casal, apesar de estarem matriculados na escola, apresentam dificuldade na interpretação de textos e escrevem com certa limitação.
"Eles vão (para a escola), mas às vezes têm que faltar e acaba atrapalhando o aprendizado, né?", resigna-se o agricultor. O filho mais novo, de 15 anos, é o "mais avançado nos estudos", conforme avalia o pai.
Já o mais velho, seguiu os rumos dos pais e também está dentro da larga estatísticas do analfabetismo. Essa realidade de analfabetos e alunos com déficit de aprendizado, segundo a titular da pasta, é mais comum do que se imagina.
Atraso
"Há muito atraso em Juazeiro do Norte. A cidade sofreu com inúmeras paralisações e isso, inevitavelmente, acaba prejudicando o aprendizado dos alunos. E acaba incentivando a evasão da sala de aula", avaliou, constatando que uma fração dos 90% da população que não se inseriram dentro do quadro de analfabetos apresentam algum tipo de atraso ou são considerados analfabetos funcionais, isto é, aqueles que têm 15 anos ou mais de idade, mas tiveram menos de quatro anos de estudo formal.
Frequência
Segundo o Plano Nacional de Educação (PNE), que determina diretrizes, metas e estratégias para a política educacional dos próximos dez anos, os estados e municípios deveriam garantir, até o fim do ano passado, que 100% das crianças e adolescentes das faixas etárias de 4 a 5 anos e 15 a 17 anos estivessem matriculadas na escola. Em Juazeiro do Norte, o índice ainda está distante do preconizado pelo PNE.
"Nossa frequência escolar é boa. Cerca de 90% das crianças e adolescentes estão assíduos nas escolas. Nossa proposta de melhorar o planejamento educacional também engloba aumentar essa taxa da frequência escolar", disse. A quantidade de alunos matriculados na rede pública do Município subiu, conforme dados da Secretaria de Educação. Passou de 32 mil, no passado, para 34 mil neste ano. "O número tende a crescer ainda neste ano letivo, pois as matrículas permanecem abertas", destacou Loureto. Para atender a demanda educacional, Juazeiro do Norte dispõe de 1.232 professores efetivos e 862 temporários.
Gestão para a Aprendizagem
Conforme projeta Maria Loureto, a meta do Município para os próximos quatro anos é reduzir o atual número de analfabetos entre 40% e 50%. Para alcançar o objetivo, ainda segundo a secretária, importantes parcerias estão sendo firmadas.
Um dos destaques foi a integração com o programa Gestão para a Aprendizagem, da Fundação Lemann, organização brasileira sem fins lucrativos, criada em 2002 pelo empresário Jorge Paulo Lemann e que atua na área da Educação no Brasil, realizando ações voltadas à inovação, gestão, políticas educacionais e à formação de uma rede de jovens talentos.
A secretária explica que o Município passou por duas etapas de seleção para participar do projeto. A primeira englobou uma série de entrevistas envolvendo ela própria, por meio da internet, e um corpo técnico da Seduc em São Paulo. "Esse projeto chega num momento importante. O nosso rendimento escolar nos preocupa muito", pontua, ao enfatizar que a Secretaria vem incentivando os professores a terem também um aprofundamento maior em leituras que venham a somar no conhecimento compartilhado em sala de aula com os alunos.
A segunda etapa foi uma visita técnica, que ocorreu na semana passada. Membros da Fundação estiveram em Juazeiro do Norte para apresentar as propostas pedagógicas que deverão nortear a capacitação que será ministrada aos professores, mediante convênio com a Secretaria de Educação. O Programa Gestão para Aprendizagem, explica Maria Loureto, terá até três anos de duração, ajudando no desenho de estratégias integradas, com assessoria personalizada, formações para diretores e coordenadores escolares.
Formação
O programa contempla também formações didáticas específicas de Português e Matemática para professores, no sentido de auxiliá-los a melhorarem suas práticas pedagógicas dentro da sala de aula. Ainda neste semestre, a Fundação dá início à assessoria personalizada para a Secretaria de Educação.
Segundo Carlos Henrique Uehara, técnico da Fundação Lemann, serão desenvolvidas atividades de capacitação para que todas as ações a elas relacionadas tenham impacto direto na sala de aula. "O principal objetivo desse programa Gestão para a Aprendizagem é a melhoria da qualidade da Educação aqui em Juazeiro do Norte", disse.
Para a coordenadora pedagógica da Secretaria de Educação de Juazeiro do Norte, Carmem Lúcia Tomaz Bezerra, essa parceria deverá fortalecer e apoiar os processos pedagógicos da Seduc. "Esperamos que, com essas formações e encontros voltados para práticas e políticas públicas, possamos garantir a excelência na qualidade de ensino e a aprendizagem dos nossos alunos", ressaltou.
Taxas
8%
Da população brasileira com 15 anos ou mais são analfabetos. Já a porcentagem de analfabetos funcionais, cujo estudo formal não ultrapassa os quatro anos, é 17,1%
12,13
Por cento da população juazeirense não sabem ler ou escrever, ou seja 29 mil pessoas. O número é 20% maior que o registrado em 2010, quando a cidade tinha 23 mil analfabetos
Fique por dentro
Metas do Plano Nacional de Educação
O Plano Nacional de Educação (PNE), em vigor desde 2014, possui 20 metas que visam melhorar a Educação no Brasil. A meta nove, que trata sobre o analfabetismo, possui duas submetas. A primeira, que não foi alcançada, pretendia atingir 93,5% na taxa de alfabetização da população de 15 anos ou mais até o ano passado. A segunda submeta, pretende erradicar o analfabetismo absoluto no Brasil até 2024.
Apesar de não ter alcançado a primeira submeta, os índices apresentam melhoria nos últimos anos. No ano passado, 8% da população brasileira com 15 anos ou mais não sabiam ler ou escrever. Em 2014, ele ficou em 8,3%; em 2013, a taxa era de 8,5% e, em 2012, era de 8,7%. Já a taxa de brasileiros considerados analfabetos funcionais, isto é, aqueles que tiveram menos de quatro anos de estudo formal, caiu de 17,6% em 2014 para 17,1% em 2015.
Mais informações:
Secretaria Municipal de Educação (Seduc)
Rua Quinze de Novembro, S/N, Bairro São Miguel
Telefone: (88) 3511-5407
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