quinta-feira, 5 de abril de 2018

Morte de Dandara: cinco réus são julgados hoje

Dandara dos Santos, 42, foi assassinada por 12 pessoas, entre adultos e adolescentes
O crime de LGBTfobia que chocou o País e repercutiu até internacionalmente chega a vias decisivas hoje. Cinco acusados de matarem a travesti Dandara dos Santos, de 42 anos, serão julgados, hoje, na 1ª Vara do Júri, no Fórum Clóvis Beviláqua, em Fortaleza, a partir de 9h. Em contrapartida, dois suspeitos do homicídio seguem em liberdade.
O julgamento do 'Caso Dandara' é muito aguardado pela sociedade, mas uma pessoa em especial pensou, todos os dias, em como será esse momento: a mãe da vítima, Francisca Ferreira. "Espero que seja feito Justiça. É o que eu peço a Deus todos os dias. Quero Justiça para eles. Foi muito cruel o que fizeram. Agora, por que não vão ser todos (julgados)?!", questionou.
Apenas Francisco José Monteiro de Oliveira Júnior, conhecido como 'Chupa Cabra'; Jean Victor Silva Oliveira; Rafael Alves da Silva Paiva (o 'Buiú'), Isaías da Silva Camurça, o 'Zazá', e Francisco Gabriel Campos dos Reis, o 'Didi' ou 'Gigia', sentam na cadeira de réu hoje, pela denúncia de envolvimento no homicídio triplamente qualificado (por motivo torpe, meio cruel e uso de recurso que impossibilitou a defesa da vítima) e na corrupção de menores.
Júlio César Braga Costa chegou a ser preso e pronunciado pela Justiça, mas recorreu da decisão e aguarda a análise do recurso, que foi distribuído à 3ª Câmara Criminal no último dia 16 de março. Já Francisco Wellington Teles e Jonatha Willyan Sousa da Silva, o 'Lourinho Briba', ainda não foram capturados pela Polícia. O advogado de 'Zazá' não atendeu as ligações, enquanto os outros defensores não foram localizados. Além dos oito adultos, quatro adolescentes foram capturados pela suspeita de matar a travesti. De acordo com o Ministério Público do Ceará (MPCE), os jovens receberam as medidas socioeducativas perante o Juízo da Vara da Infância e da Juventude de Fortaleza.
Dandara foi morta a chutes, pedradas e até tiros, no dia 15 de fevereiro de 2017, na capital cearense. Cerca de um ano e um mês depois, o processo chega à reta final para mais da metade dos adultos acusados. O promotor da 1ª Vara do Júri, Marcus Renan Palácio, acredita que a rápida elucidação do crime pela Polícia Civil e pelo Ministério Público e a possível condenação dos acusados podem servir de exemplo para o combate aos crimes de ódio.
"Se revela de especial importância, na medida em que a sociedade cearense terá a oportunidade de, em condenando os acusados, revelar que crimes desta natureza perpetrados contra pessoa que integrava grupo historicamente discriminado ao longo dos anos, não fiquem imunes à tutela jurisdicional do Estado, impedindo assim que se abriguem o deletério e sentimento da impunidade", afirmou o promotor de Justiça.
A acusação se ampara na quantidade de provas coletadas para crer na condenação dos cinco réus. "A expectativa do Ministério Público é de que, estando provada a materialidade e as autorias delituosas, sejam os réus condenados, com a incidência nas suas respectivas condutas, nas três qualificadoras descritas na pronúncia", reforçou Marcus Renan. O coordenador do Centro de Referência LGBT Janaína Dutra, Tel Cândido, afirmou que a transfobia é um desafio a ser vencido. "A gente acredita que o Caso Dandara é emblemático para mostrar à sociedade um estrato diário da violência sofrida pelo público LGBT. A solução, tendo a condenação dos acusados, é simbólico para dizer que a vida LGBT é preciosa", apontou.
Saudade
Apesar de sonhar com a manutenção da prisão dos assassinos da sua filha por muito tempo, Francisca Ferreira disse que não irá assistir ao pronunciamento da sentença do juiz, hoje. Ela está doente e também tem medo de ir ao Tribunal do Júri. "Não quero ver eles (acusados) nem quero que identifiquem ninguém da minha família".
Mesmo a condenação dos presos não irá findar a saudade de Dandara. "Perdi minha mãe, meu pai, outra filha de 2 anos. Mas nada se compara à falta que está fazendo minha filha. Francisco (nome da certidão de nascimento da travesti) não fazia mal a ninguém, só fazia o bem. Ele só trazia alegria, era muito querido. Mesmo depois de morto, está só fazendo o bem", acredita.
Dona Francisca lembra principalmente do carisma da filha. "Tanto dentro da família como com os vizinhos, era tudo normal, legal, era muito querido. Ele confiava em todo mundo, assim que conhecia. Eu até reclamava. Para mim, ele era um humorista, tinha esse dom, só não teve a oportunidade. Ele morreu somente por preconceito e inveja, por ser carismático e querido", concluiu.
Outros casos
Pelo menos 33 lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros foram assassinados no Ceará, em 2017, de acordo com levantamento do Centro de Referência LGBT Janaína Dutra. A maioria dos casos não teve a mesma resolutividade do 'Caso Dandara'.

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