O
professor universitário, escritor e advogado Reno Feitosa lançará no próximo
dia 12 de abril, às 20h00min, na Sede da Subseção da Ordem dos Advogados do
Brasil em Crato, seu mais novo livro.
Com
o título “Epistemologia jurídico-penal pós-moderna”, Feitosa faz uma
análise do direito penal a partir da filosofia jurídica pós-moderna.
Nesse
mesmo dia, receberá do legislativo municipal a Medalha do Mérito Jurídico Luiz
de Borba Maranhão, numa sessão da CâmaraMunicipal do Crato que se realizará na
Sede da OAB, no mesmohorário do lançamento do livro.
Nessa
entrevista ele detalha seus pontos de vista e dá pistas doque o leitor ou
leitora poderá encontrar em seu mais novo trabalho,refletindo sobre o direito
penal brasileiro.
Em
outubro o livro será lançado em Barcelona, na Espanha, com a sua respectiva
edição européia.
Professor
Reno fale sobre seu mais novo livro “Epistemologia jurídico-penal pós-moderna?
Esse
é o meu sexto livro e vamos fazer o lançamento da sede da OAB Crato no dia 12
de abril às 20 horas. Esse lançamento diz respeito à edição brasileira, porque
com muito esforço e você acompanha a minha trajetória, esse sexto livro terá um
lançamento de uma edição européia e essa edição será lançada em Barcelona,
Espanha, em outubro deste ano. Gostaria aqui de aproveitar e convidar os
colegas advogados, professores e juristas do semi-árido nordestino, que venham
prestigiar, pois todo o trabalho que tenho realizado, como professor e
escritor, é no sentido de fixar um posicionamento sobre a ciência jurídica no
sertão nordestino. É um convite que faço a toda a comunidade de juristas e vamos
debater o real significado desse livro e da produção acadêmica da ciência do
direito no sertão.
Quais
são as reflexões que você destaca nesse seu novo livro?
Na
verdade há uma característica constante em todos os livros queescrevo, pois
tento escrever sobre ciência do direito penal a partir da filosofia do direito.
Aí entro em questões de natureza filosófica, hermenêutica, e a partir da
epistemologia eu chego na ciência do direito penal e desço ao direito penal
propriamente dito, isto é, como conjunto de normas postas. É um modo de
escrever e compreender o direito penal que mais se parece com o que se produz
na Europa do que com o modo que se escreve no Brasil. No Brasil, na
verdade, os autores famosos escrevem livros para concurso público, são livros
de leitura rápida e não é essa a minha idéia, nem mesmo acredito na
possibilidade de se construir uma ciência a partir de manuais de concurso
público.
Sobre
o direito penal no Brasil quais são as principais discussões feitas na
academia, pelos juristas e intelectuais?
A
maioria dos autores de direito penal vem debatendo questões conceituais, ou ás
vezes questões de nome. Às vezes você pega uma divergência da ciência penal no
Brasil e na verdade são pessoas discutindo o sinônimo mais adequado para
designar um objeto normativo. É uma espécie de realismo nominalista. Uma
espécie de reminiscência do que se fazia de protociência no século XI na
escolástica medieval. Para muitos autores de direito penal do século XXI a
ciência penal no Brasil se comporta como a última filha da escolástica medieval
e isso é muito presente nos manuais de concurso público. Agora, você pega
autores da ciência do direito penal no Brasil, como Juarez Cirino e aí você vê
um debate científico atualizado do que significa ciência penal de verdade. O
direito penal no Brasil, como conjunto de normas em vigor, se gaba de um
pretenso caráter científico, mas na verdade, há um punitivismo exacerbado sem
qualquer justificação teórica, sem qualquer plausibilidade científica e que se
impõe simplesmente por ser uma agenda política que vende ao povo
brasileiro a idéia de que o direito penal resolverá os problemas sociais
graves da nação. O direito penal não tem a função de resolver problemas sociais
de natureza estrutural, pois o direito penal é seletivo, ele defende
certos bens jurídicos, específicos, contra certas condutas também
específicas, especialmente condutas de natureza grave que são socialmente
inadequadas. Ademais, o direito penal não pode ser usado como um instrumento de
política pública. Na verdade, o Brasil precisa de política pública de inclusão
social e o direito penal não promove inclusão, pelo contrário, o objetivo do
direito penal é a exclusão, é excluir certas pessoas que se mostram incapazes
de conviver socialmente. Pessoas que comentem atos específicos contra bens
específicos. E essa observação nem o Supremo Tribunal Federal consegue fazer.
Se você analisar os votos do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, discutindo
o direito penal, fica claro que ele não entende o que isso
significa.
Ele
é um dos responsáveis por esse punitivismo atual?
Não
tenha dúvida. O que os professores do direito penal no Brasil estão observando
é que o Luís Roberto Barroso parte do pressuposto de que é possível desenvolver
políticas públicas com o direito penal. Isso não funcionou em nenhuma sociedade
democrática do mundo. A gente percebe, e aí tenho conversado com professores de
Teoria Política, que o Luís Roberto Barroso tem uma tendência de refundar o
Estado Brasileiro, o que é uma coisa exacerbada, tentar refundar a
República brasileira tentando fazer uma releitura arbitrária da Constituição
Federal, um populismo judiciário. Na verdade o STF é uma espécie de poder que é
um resquício da monarquia, como diz o sociológico Jessé de Souza. Nós temos um
poder Republicano que não é constituído pelo voto popular. Qualquer movimento
no sentido de refundar a República ou o Estado Democrático de Direito precisa
de voto popular e o STF não tem voto popular. Tem um pensamento no Brasil hoje
que diz que o problema do Brasil é a corrupção que empobrece todo mundo e
os tribunais não ligam muito para as questões das políticas públicas, você vê
que eles tomam decisões contra várias categorias profissionais e o dele, eles
protegem.
Quando
surgiu essa onda da linha do Barroso, isso tem a ver, por exemplo, com a
Lava Jato?
O
Estado Moderno oriundo da Revolução Francesa é um Estado que se fundamenta na
promessa de direitos humanos. Pouca gente no Brasil consegue entender, mas os
direitos humanos foram criados pelo liberalismo, mas no Brasil encontramos
gente que se diz liberal e contra os direitos humanos. Particularmente essa
pessoa não entendeu o liberalismo que tem seu fundamento nos direitos humanos.
Mas, no Século XIX o poder legislativo se desenvolveu no sentido de efetivar os
direitos humanos, e não conseguiu essa missão a contento. No século XX a Social
Democracia fez com que o poder Executivo recebesse essa missão de concretizar
os direitos humanos, mas também não obteve o êxito esperado. O Século
XXI se apresenta como a vez do Judiciário, já que antes não conseguiram
por conta do positivismo jurídico. Isso é razoável, justo e compreensível pelo
fato de que os poderes são autônomos e independentes e o Judiciário sim
deve lutar por sua autonomia e independência, notadamente quando vai aplicar as
leis e a constituição. Mas há uma coisa interessante no Brasil. As melhores
políticas públicas aplicadas pelos juízes de primeiro grau você encontra
nas comarcas de primeira entrância por estarem mais próximas do povo, e
esses juízes vem desenvolvendo excelente trabalho nesse sentido, o de dar
aplicabilidade à Constituição Federal e resolver os casos concretos de um modo
que supre a ausência do legislativo e do executivo. Mas quando observamos o
comportamento do STF, este não tem dado bom resultado. Aí entra em cena a Lava
jato. A Lava jato fez do direito penal algo como uma solução para o problema da
corrupção no Estado brasileiro que é histórico e secular e que
simplesmente não vai se resolver pela união entre uma parte do Judiciário
Federal e a mídia nacional, que se uniram para fazer do direito penal a
resolução dos problemas estruturais do Brasil. Na verdade isso é um jogo
político-midiático, com a participação de uma pequena parcelado Ministério
Público Federal, que interferiu decisivamente nos rumos da República, teve uma
participação muito grande na eleição do atual presidente da República,
inclusive prendendo os seus adversários políticos. É mais um jogo de política
partidária do que de direito penal. Por trás disso existe a importação de
institutos jurídicos do direito norte-americano de maneira descontrolada, sem o
filtro constitucional, e além do mais, há um vício cognitivo grave atrás do
lavajatismo e do punitivismo que é uma espécie de ponderação de regras
jurídicas, o que é academicamente insustentável. Ponderação de regras jurídicas
que eu quero lhe dizer é uma ponderação a respeito da leitura da lei em sentido
estrito. A ponderação existe no conflito entre princípios constitucionais,
não no conflito de regras jurídicas. Quando você pega um conflito de valores
constitucionais você pondera de modo tal que os princípios da
Constituição não se anulem uns aos outros. Agora quando você vai aplicar
as regras jurídicas, portanto, os artigos da lei penal, você não faz
ponderação, você aplica um ou outro dispositivo da lei em sentido estrito. Você
opta por um artigo da lei penal e sacrifica outro, através de vários mecanismos
técnicos, como por exemplo, o princípio da especialidade da norma. Existem
vários mecanismos para isso, mas volto a dizer que não existe ponderação na
aplicação de regras jurídicas. A ponderação é possível na aplicação de
princípios constitucionais. Quando você aplica ponderação no conflito de regras
você gera a insegurança que hoje graceja a aplicação do direito penal e do
processo penal no Brasil.
A
academia está reagindo a esse punitivismo e às teorias importadas dos Estados
Unidos?
Está
sim. A academia no Brasil, dos autores que realmente se comportam como
cientistas do direito penal e não apenas como concurseiros, estão denunciando
esse estado de coisa. No entanto, às vezes a gente percebe no Brasil o
fato de que há um certo regozijo pelo fato do poder conseguir se desprender da
racionalidade acadêmica. É como se a ciência do direito penal fosse uma
questão de vaidade, fosse uma tentativa vã de que a razão controle o exercício
do poder. Isso é lamentável, mas acontece. Às vezes, encontramos até nas cortes
colegiadas, em súmulas de tribunais superiores, certos defeitos racionais
graves como, por exemplo, falsos silogismos ou mecanismos de raciocínios falaciosos.
A falácia é uma espécie de raciocínio que é válido, mas, no entanto, não é
verdadeiro. E o mundo jurídico utiliza esses mecanismos e faz raciocínios
válidos, mas raciocínios não verdadeiros, o que de certa forma é decorrência da
matematização do direito penal iluminista do século XIX. De certa forma esse
raciocínio está contido dentro da idéia de imputação penal que é realizada no
Brasil ainda com base na Teoria Pura de Hans Kelsen. Os dilemas racionais
contidos na obra de Hans Kelsen e no positivismo geraram uma teoria
da imputação defeituosa, essa teoria da imputação efeituosa, defeituosa
no sentido de gracejar e abusar de raciocínios silogísticos falsos, isto
é, válidos, mas não verdadeiros, cria um direito penal desumano, classista e cria
um direito penal que pune severamente quem é mais pobre. Às vezes os
juízes não percebem que estão realizando um julgamento classista ou racista ou
contra minoritário, pois não percebem que tais problemas lógicos são muito
profundos e que são concretizados nas cortes superiores, de modo que os juízes
de primeiro grau simplesmente vão repetindo. E a máquina se transforma em
perversa sem que as pessoas percebam.
No
lançamento dia 12 de abril você receberá da Câmara de Vereadores o título do
Mérito Jurídico Luís de Borba Maranhão, de autoria do vereador Roberto
Anastácio.
Para
mim é uma imensa satisfação receber da Câmara de Vereadores do Crato esse
reconhecimento. Agradeço imensamente à Câmara e mais uma vez convido os
juristas a se fazerem presentes. A academia caririense também. Temos hoje
diversos professores de direito penal no Cariri. Vai fazer 20 anos que sou
professor universitário e muitos foram meus alunos. Convido não apenas a
comunidade acadêmica da URCA, mas toda a comunidade acadêmica do Cariri. Espero
que esse livro seja entendido como a expressão de uma certa racionalidade
peculiar ao semi-árido nordestino. Meu esforço sempre foi de certa
forma contribuir para a afirmação da identidade do semi-árido
nordestino, nosso sertão.
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