(Fotos: Kid Junior) |
Pontualmente às 16h20, abrindo o terceiro dia de desfiles carnavalescos na Avenida Domingos Olímpio, um grupo animado e diferente entoava o que não é apenas um samba-enredo, mas uma declaração orgulhosa do que se é: "É a Turma do Papelão!".
Com o tema "Nenhum direito a menos", o bloco Turma do Papelão é o primeiro autenticamente formado por pessoas em situação de rua na capital cearense. Apesar da agremiação desfilar há três anos consecutivos, somente neste ano estreou na competição dos principais grupos do Ciclo Carnavalesco de Fortaleza.
A avenida foi tomada por muita dança e alegria, além de cores e brilhos que surgiam das fantasias e do olhar de quem participava do evento. Com figurino improvisado, mas com muito significado, Maria Gracie, de 54 anos, carregava no peito suas reivindicações.
Participando pela segunda vez do bloco, Maria é originária de Pentecoste, no interior do Ceará, mas habita a Praça do Ferreira há cinco anos.
A situação não é motivo de vergonha para ela que, com um sorriso no rosto, demonstra orgulho pelos feitos da Turma do Papelão. "Aqui todo mundo é amigo, todo mundo é irmão e todo mundo se ajuda a fazer as fantasias. Não tenho nenhuma vergonha de dizer onde moro, de onde eu sou, de onde eu vim", conta.
Contemplado pelo Edital de Apoio da Prefeitura de Fortaleza, realizado por meio da Secretaria Municipal de Cultura (Secultfor), o bloco tem como proposta fundamental o reconhecimento dessas pessoas e a sensação de pertencimento delas à festa dita popular.
Voluntária do projeto há dois anos, Ana Flávia, 23, desfilou pela primeira vez no bloco usando um vestido feito inteiramente de sacos plásticos. Parte da "Ala da Sustentabilidade", a intenção da peça é bem clara.
"Ela propõe ressignificar o lixo, que é o trabalho da maioria desse povo. A fantasia quer mostrar justamente tudo o que eles conseguem fazer com o que as pessoas consideram descartável", explica a jovem.
O papelão também é matéria-prima de grande parte dos figurinos do bloco. Simbólico, o material evoca algumas das vivências das pessoas em situação de rua, visto que é ferramenta de trabalho, é leito e é marca de resistência.
A Turma do Papelão é formada por cerca de 100 pessoas, de diferentes bairros, unidos pela vontade de retratar suas histórias e curtir o Carnaval. O grupo é guiado pelo arte-educador André Luís Foca, que dedica a vida aos trabalhos culturais e assistenciais.
Após a apresentação, com o cansaço visível no rosto de todos, assim como a satisfação de uma tarefa bem executada, o organizador resume o feito com um propósito. "A nossa força é sempre o movimento social e a arte é nosso meio", declara. Diário do Nordeste
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