Granjeiro, na região do Cariri. Foto: Antonio Rodrigues |
Apenas quatro das 184 cidades cearenses não registraram óbito por decorrência da Covid-19 neste ano de 2021: São João do Jaguaribe, Senador Sá, Umari e Granjeiro, na região do Cariri. A informação foi confirmada pelas secretarias de saúde dos municípios. O quantitativo representa somente 2,17% de todos os municípios do Estado.
Granjeiro, inclusive, é a cidade com menor número de mortes registradas durante toda a pandemia: dois. O primeiro registro foi em 4 de setembro do ano passado e, o segundo, no dia 17 daquele mesmo mês. O município, distante 484 KM de Fortaleza, foi o último a ter registro de óbitos em decorrência da infecção por coronavírus em 2020.
Contudo, segundo dados da IntegraSus, da Secretaria da Saúde (Sesa) do Estado, extraídos às 9h13 desta terça-feira (30) a lista de cidades sem óbitos em 2021 é composta por dez cidades. Além das quatro citadas acima, a Sesa inclui Ararendá, Novo Oriente, Quixelô, Saboeiro, Salitre, Ubajara.
No entanto, o Diário do Nordeste entrou em contato com as Secretarias da Saúde destes municípios e apurou que já houve registro de mortes em 2021 nesses locais. Em Salitre e Novo Oriente, por exemplo, já são quatro mortes neste ano. Em Saboeiro, Quixelô e Ararendá teve ao menos um óbito. Já em Ubajara são pelo menos cinco mortes em 2021 por decorrência do vírus. A Sesa informou que fará uma auditoria nos dados a partir dessa inconformidade e, até a publicação da matéria, não informou o motivo dessa incorreção.
CIDADES MENOS POPULOSAS
Mas quais fatores podem explicar esse panorama positivo nas quatro cidades sem registro de mortes? Os gestores reconhecem que o número de habitantes reduzido “ajuda a conter a disseminação” do vírus, mas ressaltam outros pontos tidos como preponderantes para a drástica redução da mortalidade, como o respeito às medidas sanitárias, testagem em massa e vacinação avançando de forma acelerada.
O médico infectologista e professor adjunto de pediatria do curso de medicina da Universidade Federal Ceará (UFC), Robério Leite, explica que o fato das quatro cidades terem menos de dez mil habitantes contribui para o processo de conter o avanço da doença.
"Mais uma vez temos dois prismas. É fato que em uma cidade de menor densidade populacional o vírus circule com menor intensidade e, na teoria, seja mais fácil conter a transmissão. Mas, quando a um infectado grave, geralmente o acesso as unidades hospitalares é mais distante e esse tempo de deslocamento pode ser um fator de risco".
Robério conclui que, independentemente do porte da cidade, as recomendações sanitárias são universais e devem ser seguidas. "Manter o distanciamento social, usar máscaras e higienizar as mãos. Tudo isso aliado a vacina é o caminho para vencer a pandemia", conclui.
Para Mila Lopes da Silva, titular da Secretaria da Saúde de São João do Jaguaribe, o principal responsável por essa redução é a população. “Eles [habitantes] entenderam a gravidade do problema e colaboraram. Nossa cidade, ainda que pequena, não tem registro de aglomeração, o comércio tem respeitado todas as medidas sanitárias e estamos, há alguns meses, com relativa tranquilidade em relação ao surgimento de novos casos”, avalia.
A última morte no Município foi em 20 de dezembro do ano passado. Ao todo, a cidade tem quatro óbitos por decorrência do novo coronavírus. A média móvel de novas infecções que chegou a 4,14 no dia 12 de janeiro deste ano – a mais alta desde o início da pandemia – caiu para 0,4 nesta segunda-feira, dia 29. Os dados são do portal IntegraSus.
A forte tendência de queda nos casos conferiu ao Município, no início deste mês, o status de única cidade do Estado com risco normal de transmissão. Para Mila, os números refletem uma parceria exitosa entre população e agentes de saúde.
“Fomos transparentes desde o início da pandemia, passando com fidelidade todos os números. Deste modo, a população compreendeu o cenário e ajudou [a reduzir os indicadores]”, conclui.
TESTAGEM EM MASSA
Em Umari, cidade com pouco mais de 7.700 habitantes, a estratégia foi ampliar a testagem para obtenção de diagnósticos precoce. “Quando identificamos o infectado nos primeiros dias, evitamos que ele transmita esse vírus para outras pessoas”, pondera Josué Barros, enfermeiro-chefe do Município.
Quando um morador apresenta qualquer sintoma, acrescenta Josué, é aplicado o teste e, até que saia o resultado, “ele e seus familiares em contato direto são orientados a permanecerem em casa”. Esse “bloqueio familiar” é monitorado pela equipe da saúde do Município.
“O isolamento tem sido respeitado e esse é um dos principais fatores que levaram à redução de casos e mortes em Umari”, considera Barros.
Além disso, o profissional pondera que a cidade tem investido na fiscalização e conscientização. Com ações desenvolvidas por uma equipe multidisciplinar, composta com enfermeiros, técnicos e agentes de saúde, as aglomerações no Município cessaram.
“Não há mais registro nesse sentido. Claro que a população é a grande responsável por esse sucesso. Nossos moradores abraçaram a causa. Pouco se ver pessoas na rua sem máscara, por exemplo”, reforça Josué.
O reflexo desse engajamento pode ser observado na média móvel de novos casos do Município. Ontem (29) a média era de 0,14. Ao longo de todo este ano, a maior oscilação da média foi de 1,28. Com a tendência de queda, as barreiras sanitárias foram desfeitas.
“Umari foi uma das primeiras cidades do Ceará a montar barreira sanitária na primeira onda. Neste também fizemos, ainda no mês passado. O objetivo era evitar que pessoas de outras cidades entrassem em nosso Município. Quando a situação foi controlada, desfizemos. Não baixamos a guarda, seguimos com todos os cuidados, mas o panorama de hoje é favorável”, conclui Josué.
A reportagem do Diário do Nordeste entrou em contato com as Secretarias da Saúde de Granjeiro e Senador Sá, no entanto, embora ambas tenham confirmado a ausência de óbitos neste ano de 2021, não quiseram conceder entrevista. As cidades têm, respectivamente, dois e seis mortes por decorrência da Covid-19. O último óbito, conforme o IntegraSus, ocorreu em 7 de outubro em Senador Sá.
VACINAÇÃO ACELERADA
Em São João do Jaguaribe, quase 15% da população já foi vacinada. Ao todo, o Município que conta com cerca de 7.900 habitantes, conforme Censo do IBGE, já imunizou 998 pessoas. A cidade recebeu 1.358 doses.
Mila ressalta que a estratégia adotada no Município foi vacinar o grupo prioritário em casa. “Grande parte desse público está em áreas rurais, então a gente optou pela vacinação volante. É mais seguro ao idoso e, na nossa avaliação, foi a estratégia que melhor respondia à nossa realidade. Para idosos acima de 75, já imunizamos mais de 80% e, do grupo de 70 a 74 anos, atingimos a marca dos 70%”, detalha.
Em Umari, das 1.350 recebidas, 1.210 já foram aplicadas, isto é, quase 90%. Deste total, 390 vacinas foram ministradas em profissionais da saúde e 820 em idosos acima de 70 anos. De acordo com a Sesa, 75% dos municípios cearenses possuem mais pessoas vacinadas do que casos positivos de Covid-19. No entanto, o ritmo ainda precisa ser intensificado. Isso porque, com atual acesso e ritmo de vacinação, Ceará levará até outubro para aplicar 1ª dose em prioridades.
IMPORTÂNCIA DA IMUNIZAÇÃO
Embora a vacinação tenha sido citada como um dos pontos que podem explicar a ausência de morte nesses municípios, o médico infectologista Robério Leite, adverte que ainda é cedo para se fazer essa correlação.
Ele considera importante o processo de imunização, mas lembra que para se ter uma resposta em massa, é preciso avançar ainda mais na vacinação do grupo populacional.
"A vacina traz a proteção individual e coletiva. São duas coisas distintas. No coletivo, é preciso avançar para que sejam feitos estudos e se observe os resultados. Na individual é muito provável que alguns idosos vacinados tenham sim, sido salvos por conta do imunizante", detalha.
Fonte: Diário do Nordeste
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