Alimentos básicos da dieta do cearense, arroz e feijão vêm sofrendo uma escalada íngreme de preços que pesa bastante no bolso dos consumidores. Com a renda comprometida pelos efeitos da pandemia, as famílias estão deixando de consumir outros produtos para garantir pelo menos o básico. Entenda por que esses dois itens têm ficado tão caros.
Segundo a inflação oficial, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e monitorado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), tanto o arroz e quanto o feijão vinham em trajetória de alta nos preços em Fortaleza até dispararem em setembro do ano passado, ambos com alta de 20,58% no mês.
No acumulado dos últimos 12 meses, entre março de 2020 e março deste ano, o arroz alcançou uma alta de 70,22%, seguido pelo feijão fradinho, que ficou 63,01% mais caro no período. Somente no primeiro trimestre de 2021, o feijão apresentou avanço de 8,02%, enquanto o arroz tem leve queda de 2,63%.
Nos supermercados da Capital, em março, o quilo do arroz custava, em média, R$ 5,85, segundo levantamento da cesta básica divulgado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Já o quilo do feijão alcançou R$ 7,78 no mês passado.
Em 2020, o arroz e o feijão ficaram entre os cinco alimentos que mais encareceram ao longo do ano em Fortaleza, de acordo com o IPCA. O óleo de soja foi o campeão, registrando aumento de 121,39%, pouco à frente do próprio arroz (82,74%), do feijão fradinho (81,44%), do tomate (62,13%) e da cenoura (52,42%).
ESCALADA DO ARROZ
O analista de mercado da Ceasa, Odálio Girão, revela que a forte alta do arroz tem acontecido por conta da baixa oferta do produto durante a pandemia. Ele explica que, independente da Covid-19, o Brasil não é um país autossuficiente na produção do grão, o que o torna dependente de outros mercados para garantir o abastecimento nacional.
"O Rio Grande do Sul é responsável pela maior parte da produção brasileira, mas não tem como abastecer tudo. As importações vêm de países como Argentina, Paraguai, Peru, Colômbia e até da Ásia, como da China e da Tailândia", revela.
Com a pandemia, o volume de arroz disponibilizado para o Brasil tem sido menor, além do controle mais rigoroso da entrada de produtos no País atrasar a liberação das cargas. "A oferta ficou bem reduzida e o mercado nacional não tem abastecimento regulador que mantivesse esses preços saudáveis", aponta Girão.
Ele detalha que a produção nacional só corresponde a cerca de 70% do consumo brasileiro, de forma que 30% a 40% da demanda ainda é abastecida com arroz importado.
TAXA DE CÂMBIO
Outro fator que influenciou o preço do arroz foi a taxa de câmbio. Segundo o supervisor técnico do Diesse, Reginaldo Aguiar, a desvalorização da moeda brasileira fez parte dos produtores preferirem exportar a produção, reduzindo ainda mais a oferta interna.
"Com a pandemia, o preço de alguns produtos básicos foi dolarizado, como a carne, a soja, o óleo de soja e o arroz. Produtos que antes estavam com preços estabilizados com o aumento da demanda mundial tiveram um pico. Com a desvalorização do real, ficou mais atrativo exportar, o que gerou choque interno de oferta, ou seja, faltou produto"
REGINALDO AGUIAR
Supervisor técnico do Dieese
Ele ainda pontua que o preço do arroz no Brasil é ajustado pela quantidade plantada. Se o preço sobe, os produtores plantam mais, se cai, plantam menos. "Isso acontece porque não há controle sobre a demanda", acrescenta.
ALTA DO FEIJÃO
O controle de preços através da produção também estaria ocorrendo com o feijão, segundo Aguiar. Ele lembra que esse fenômeno vem sendo observado desde 2017, quando o produto teve um pico. "Quando o preço atinge o pico, satura, e depois cai um pouco. Mas os produtores ajustam a produção para manter o preço sempre em patamares elevados. Desde o ano passado, tivemos fortes altas e tem-se mantido assim até agora", alerta.
Ele esclarece que a cultura do feijão é predominantemente irrigada, de forma a sofrer menos com fenômenos climáticos, como secas e cheias, acontecimentos que também não foram registrados com intensidade no último ano.
Já o analista de mercado da Ceasa ressalta que as chuvas mais recentes não foram suficientes para recuperar as perdas na produção. Segundo Girão, algumas regiões produtoras tiveram chuvas em abundância, enquanto em outras as precipitações demoraram mais, resultando em uma redução da safra.
"O feijão carioquinha é o mais consumido no Brasil, correspondente a cerca de 80% do consumo nacional. Mas o cearense também incluiu no dia a dia o feijão preto, de corda e branco durante a pandemia por conta dos preços"
ODÁLIO GIRÃO
Analista de mercado da Ceasa
PREVISÃO PARA OS PRÓXIMOS MESES
Conforme Girão, o preço do feijão deve ceder um pouco nos próximos meses com a chegada da safra que é plantada em setembro e colhida em abril. A melhora dos fatores climáticos nas regiões produtoras, especialmente no Paraná, Goiás e Minas Gerais, também deve ajudar os valores do grão no decorrer do ano.
Já a previsão para os preços do arroz é que eles permaneçam altos enquanto o câmbio estiver elevado e não houver a liberação de importações em maior escala. "Mesmo com a recuperação da produção em Goiás e no Rio Grande do Sul, ainda vamos depender de importações. Com o dólar em alta, os preços vão se manter elevados. Não temos perspectiva de baixa enquanto o câmbio não tiver equilibrado".
IMPACTO PARA O CONSUMIDOR
Aguiar ressalta que o arroz e feijão são alimentos básicos da dieta da cearense e bens insubstituíveis. Com a forte alta de preços, as famílias estão tendo de abrir mão de outros produtos para ter, pelo menos, o básico. "Não tem como colocar milho no lugar do feijão, por exemplo. Então, é necessário dispensar mais recursos desse rendimento já baixo para comprar alimentos essenciais em detrimento de outros produtos e serviços", pontua.
Conforme a última edição da pesquisa sobre a cesta básica em Fortaleza do Dieese, referente ao mês de março, uma família de quatro pessoas, formada por dois adultos e duas crianças, gasta, em média, R$ 1.551,15 apenas com alimentação por mês, exigindo que o salário mínimo vigente fosse de R$ 5.315,74 para garantir todas as despesas básicas previstas na Constituição.
Fonte: Diário do Nordeste
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