Foram R$ 5 bilhões emprestados a beneficiários do Auxílio Brasil por meio do empréstimo consignado em outubro, segundo dados do Banco Central. Mas, ao que parece, passadas as eleições, a fonte secou.
“Não só eu, mas várias amigas minhas não conseguiram. E elas também são mulheres sozinhas e com filhos. Infelizmente, isso aí é furada”, desabafa Maria Elizete de Carvalho, de 61 anos.
Assim como ela, muitos beneficiários do Auxílio têm tido o consignado negado. A auxiliar de serviços gerais Cherliane de Carvalho, de 44 anos, diz que tentou contratar o crédito por três vezes – e em todas teve o pedido negado.
“Minha nora conseguiu, faz um mês. Ela que falou para eu tentar também. Eu fui na semana seguinte e foi negado. Aí duas semanas atrás deu no jornal que eles voltaram a dar [o empréstimo consignado], então eu fui lá tentar de novo”, contou.
Cherliane diz não saber por que não foi elegível a contratar o empréstimo consignado. “Eu fui na Caixa e na lotérica. Só disseram que foi negado, sem explicar o motivo. Na Caixa, me mostraram a tela do computador, mas eu não sei ler. Na lotérica me deram um papel informando que não fui aprovada”.
Negado por que?
Procurada pelo g1, Caixa Econômica Federal, principal banco a ofertar a linha, diz apenas que a concessão do crédito “obedece a critérios internos de governança, com base no contexto de mercado, no monitoramento de seus produtos e nas estratégias do banco”, e que “as linhas de crédito do banco estão ativas e que todos esses critérios são constantemente avaliados tecnicamente e visam garantir a sustentabilidade e competitividade da instituição”.
O banco não informa, no entanto, qual o volume de crédito concedido desde o início de novembro – em outubro, a própria Caixa divulgou que, apenas entre os dias 10 e 25 de outubro, havia emprestado R$ 4,2 bilhões a 1,6 milhão de beneficiários do Auxílio Brasil.
Contestações
Os riscos de que a concessão do consignado pudesse interferir no resultado das eleições levou o Tribunal de Contas da União (TCU) a recomendar, em 21 de outubro, a suspensão da modalidade.
Em 15 de novembro, entretanto, o procurador-geral da República, Augusto Aras, enviou manifestação ao Supremo Tribunal Federal (STF) na qual disse que o empréstimo consignado do Auxílio Brasil é inconstitucional.
E, no último dia 30, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) pediu ao tribunal para apurar a responsabilidade do presidente Jair Bolsonaro na concessão de empréstimo consignado a beneficiários do Auxílio Brasil em período eleitoral.
O subprocurador Lucas Furtado agora pede a responsabilização da presidência da Caixa e de Bolsonaro por uso eleitoral do benefício.
Uma reportagem do portal UOL mostrou que documentos internos determinaram a mudança de regras e o corte da liberação desse tipo de crédito. A Caixa, no entanto, não se pronunciou sobre o assunto.
‘Era pra ajudar com roupa e comida’
Para quem esperava o crédito, a dificuldade na concessão é um balde de água fria.
Mãe de cinco filhos, a auxiliar Cherliane diz que queria contratar o empréstimo por causa do Natal. “Era para ajudar com roupa e comida”, destacou. Desempregada, ela encontra dificuldade de voltar para o mercado de trabalho e de aumentar a renda.
“Sou analfabeta. Tem emprego [disponível no mercado], mas na minha área de serviços gerais está difícil conseguir porque a maioria exige saber ler e escrever”, lamentou.
Já a cabeleireira Beatriz Rodrigues, de 28 anos, queria o dinheiro para melhorar suas condições de trabalho.
“Quando eu vi esse empréstimo, eu imaginei: ‘vou adquirir um empréstimo para montar um espaço para eu poder trabalhar na minha própria casa’. Tenho três filhos e isso ajudaria bastante”.
Beatriz fez a simulação do empréstimo pelo aplicativo Caixa Tem mas, além de não conseguir o crédito, teve outro problema: teve o valor da parcela descontado do benefício.
“A parcela de novembro do meu Auxílio Brasil já aparecia com o desconto de R$ 160, mesmo sem nenhum dinheiro do empréstimo ter caído na minha conta. Entrei no aplicativo do Auxílio Brasil e lá também mostrava o benefício descontado”, conta.
“Era um momento em que a minha filha estava doente e eu precisava urgentemente comprar o remédio para ela, meu gás já tinha acabado e de comida eu só tinha arroz para fazer”, conta.
O dinheiro ‘reapareceu’ após Beatriz reclamar em uma agência da Caixa. Mas o crédito mesmo, ainda nada.
“Eu pretendo tentar pegar o empréstimo novamente, porque preciso muito do dinheiro para eu poder abrir um espaço para eu poder trabalhar”, diz.
Maria Elizete, que deixou o trabalho de costureira por problemas na coluna, pretendia usar o empréstimo para pagar as contas de casa em meio à alta no custo de vida.
“Lá, eles disseram que não estavam fazendo esse empréstimo. Respondi: ‘Mas já não está liberado? O governo liberou’. E a atendente respondeu: ‘Não, para nós não está liberado’”, conta.
Fonte: g1
Nenhum comentário:
Postar um comentário