domingo, 16 de abril de 2023

Entenda como as chuvas no Cariri impactam no aporte do maior açude do Ceará

Rio Batateira, que nasce no sopé da Chapada do Araripe e forma o Rio Salgado. Foto: Antonio Rodrigues

O abastecimento da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), onde há cerca de 4,2 milhões de moradores, sempre foi motivo de preocupação. Mas de onde vem a tão esperada água para abastecer a capital cearense e cidades vizinhas? Além da própria Bacia Metropolitana, composta por 22 reservatórios menores, o Açude Castanhão, o maior do estado, foi construído no leito do Rio Jaguaribe para oferecer essa garantia hídrica.


Ao contrário do que parte dos cearenses imaginam, se hoje o Castanhão atinge seu melhor volume dos últimos nove anos, com 30%, as chuvas no Cariri foram cruciais. Mesmo distante a cerca de 200 quilômetros do maior açude do estado, o vale do Rio Salgado é responsável por cerca de 60% do seu aporte, estima a Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh). “A recarga dele depende basicamente das águas da Bacia do Salgado”, enfatiza o geólogo e presidente da Sociedade Anônima de Água e Esgoto do Crato (SAAEC), Yarley Brito, que também foi gestor da companhia.


No Cariri, diferente das demais regiões do Estado, as chuvas chegam mais cedo, tendo sua estação chuvosa entre janeiro e abril e a pré-estação em dezembro. A gerente de meteorologia da Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), Meiry Sakamoto, explica que isso acontece devido a influência das frentes frias que alcançam o estado da Bahia. “A proximidade dessas frentes frias gera áreas de instabilidade e favorece a formação de nuvens de chuva”, detalha.


Outro fator que influencia as chuvas no sul do estado, aponta Meiry, é a atuação de Vórtices Ciclônicos e Cavados de Altos Níveis. “São sistemas meteorológicos cujas atuações são mais frequentes no período que chamamos de pré-estação chuvosa, que engloba os meses de dezembro e janeiro“. Nos demais períodos do ano, o sul do Estado segue sob influência da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT), principal sistema indutor de chuvas durante a estação chuvosa do Ceará.



CHUVAS NO CEARÁ


Em 2023, São José tem sido bem generoso com o Cariri, como acreditam os mais antigos. Em janeiro, por exemplo, sua normal climatológica é de 148,3 milímetros, mas neste ano o volume das chuvas foi de 194 milímetros, ou seja, 30,8% acima. Já em fevereiro ficou um pouco abaixo, registrando 155,9 milímetros na região, que representa 6,5% menor que sua média (166,8 mm). Por outro lado, o mês de março teve grande destaque. Os acúmulos no período chegaram a 304,7 milímetros, superando em quase 40% a sua normal climatológica, que é de 218,4 milímetros.


O bom volume das precipitações se reflete nos reservatórios que compõem a Bacia do Salgado. Segundo o Portal Hidrológico, gerido pela Cogerh, seis dos 15 açudes estão sangrando. Somando todos eles, o volume médio é de 66,69%. Outro dado interessante é que 8 dos 15 rios da região, até o fim de 2022, estavam perenes, ou seja, não apresentam interrupção no fluxo de suas águas.



CAMINHO DAS ÁGUAS


Para entender como estas chuvas tão distantes são importantes para o Castanhão, é preciso conhecer um pouco da Bacia Hidrográfica do Rio Salgado. Com 308 quilômetros de extensão, o rio Salgado surge da confluência do riacho dos Porcos e do rio Batateiras. Os dois nascem no sopé da Chapada do Araripe, o primeiro em Porteiras e o segundo no Crato. De lá, seguem até desaguar no Rio Jaguaribe, um pouco após a cidade de Icó, abaixo do Açude Orós, o segundo maior reservatório do Ceará.


Encravado em um território com vários afluentes, a bacia hidrográfica do Salgado tem uma característica interessante: 20% dela são formadas pela Bacia Sedimentar do Araripe. Composta por vários aquíferos, as fontes naturais geram os primeiros riachos numa drenagem que começa a 750 metros de altitude.


No Crato, o rio Batateiras se une aos rios Granjeiro e Saco-Lobo. Mais à frente, já em Juazeiro do Norte, se encontra com o Carás, que também nasce no Crato, no distrito de Santa Fé e recebe água de outros riachos. Na terra do Padre Cícero, com o nome de Rio Salgadinho, recebe água do rio Salamanca, principal curso d’água que nasce em Barbalha. De lá, segue em direção à Cachoeira de Missão Velha, no município homônimo, se encontrando com outros riachos.


Foi a partir de Missão Velha que o Açude Castanhão recebeu um importante combustível para o seu aporte: as águas do Projeto de Integração do Rio São Francisco (PISF). É até lá que corre o chamado “eixo emergencial” do Cinturão das Águas do Ceará, que colhe a água do “Velho Chico”, em Jati, a 53 quilômetros, até chegar ao Riacho Seco, onde segue por gravidade por 13 quilômetros até o Rio Salgado. Por causa do bom volume de chuvas em 2022 e também neste ano, a captação não foi necessária. “O PISF funciona por demanda. Este ano não precisamos ainda”, explica o gerente regional da Cogerh, Alberto Medeiros.


Outro importante afluente do Rio Salgado é o Riacho dos Porcos, que tem como seu principal afluente o riacho São Miguel, que nasce em Mauriti. Suas águas encontram-se em Milagres, que depois vai desaguar no Rio Salgado, no distrito de Ingazeiras, em Aurora. Por isso, as fortes precipitações em Milagres, Mauriti, Jati, Brejo Santo, Abaiara, Porteiras e Barro são importantes para o aporte do maior reservatório do Estado.


ORÓS


Também diferente do que se pensa, as águas que descem pelo Rio Jaguaribe, passando pelas cidades de Tauá, Aiuaba, Saboeiro, Jucás, Iguatu, ou pelo Rio Cariús, que atravessa Santana do Cariri, Nova Olinda, Assaré, Farias Brito, Cariús, Jucás e Iguatu, não chegam ao Castanhão porque são barradas pelo Orós.


O cenário seria diferente se o segundo maior reservatório do Estado sangrasse, mas hoje ele está com cerca de 61,35% de sua capacidade. Outro açude importante, que em caso de sangria pode ajudar no aporte do maior reservatório do Ceará é o Lima Campos, que fica em Icó, no leito do Rio São João. Atualmente, ele atinge 88,18% de sua capacidade.


Fonte: Jornal Opinião CE

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